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Fetichização da violência contra a mulher

violencia contra a mulher

Uma parcela significativa da pornografia consumida por milhões de pessoas todos os dias reforça a mensagem de que a violência sexual é uma parte normal do sexo, tornando mais desafiador para muitos jovens se prepararem para relacionamentos sexuais saudáveis, onde consentimento e limites são respeitados. À medida que nossa sociedade continua a contar com a cultura do estupro e as coisas que a perpetuam, é importante que comecemos a reconhecer o papel que a pornografia desempenha na normalização da violência sexual.

Tanto estudos correlacionais quanto experimentais constatam que a exposição de adolescentes e jovens adultos à mídia, que sexualiza meninas e mulheres, está associada a uma maior aceitação de noções estereotipadas e sexistas sobre gênero e papéis sexuais, incluindo noções de mulheres como objetos sexuais.

O impacto dessas imagens na forma como meninas e mulheres se relacionam com seus próprios corpos é muito forte. A mídia constrói padrões e diretrizes de comportamento, ensinando qual é a forma que uma mulher deve se portar ou parecer para ser desejada. Ser sexy vira um valor a ser perseguido pelas meninas e, as que não se encaixam nesses padrões, são vistas como menos femininas, falhas, neuróticas e reprimidas. Relacionado diretamente a isto, é o crescente número de mulheres que recorrem a procedimentos estéticos e cirúrgicos para modificarem e “adequarem” seus corpos ao padrão imposto. 

Segundo dados da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS), o Brasil foi o segundo país do mundo que mais realizou cirurgias plásticas em 2020, tendo realizado 1,3 milhão de procedimentos cirúrgicos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Dentre os procedimentos mais realizados, estão a lipoaspiração, aumento dos seios, cirurgia na pálpebra, abdominoplastia e lifting de mama. O Brasil está em primeiro lugar no ranking de países que mais realizam a labioplastia – cirurgia realizada na vulva, parte mais externa da genitália feminina, para deixá-la no “padrão” criado pela pornografia. 

Até mesmo nas relações usuais – namoros, noivados, casamentos, relações estáveis, etc. – a pornografia passou a pautar o que deve ser considerado um sexo “bom”, o que tem causado mal-estar e sofrimento psíquico, quando não situações de assédio, abusos e estupro, que muitas mulheres acreditam que devem ser vistas como naturais.

Violência nas relações sexuais

A pornografia é recheada de cenas com tapas no rosto, puxão de cabelo, xingamentos, ejaculação no rosto, enforcamento, dentre inúmeras outras atitudes degradantes; isto pode ser encontrado nas pornografias mais leves. Nas pornografias mais pesadas se encontram mulheres espancadas, feridas, sendo penetradas por vários homens ao mesmo tempo, cenas retratando estupro e até morte. Pensemos o que isso diz sobre nossa cultura e que preceitos têm sido propagados.

Segundo um estudo que analisou 50 dos filmes pornográficos mais populares, 88,2% das cenas continham algum tipo de agressão física, sendo espancamento, gagging e tapas de mão aberta os tipos de agressões mais comuns. Agressões verbais apareceram em 48,7% das cenas, sendo os xingamentos (como por exemplo, vadia e vagabunda) os tipos de agressões verbais mais comuns. Os atos de agressão, tanto físicos quanto verbais, eram mais comumente voltados para as mulheres (94,4%). Os homens foram os agressores duas vezes mais que as mulheres, cometendo 70,3% dos atos agressivos. Mesmo quando as mulheres eram as perpetradoras, seus alvos eram frequentemente mulheres. A agressão entre homens esteve presente em apenas 0,3% das cenas registradas e eram mais frequentemente verbais. 

A distribuição em massa de revistas pornográficas, livros, vídeos e programas de computador perpetua o abuso sexual e a discriminação no mundo real da desigualdade social porque legitima o assédio, a discriminação e o abuso como formas de prazer sexual e entretenimento. A pornografia cria um ambiente em que homens (e mulheres) têm dificuldade em acreditar em mulheres que falam sobre estupro, agressão, abuso sexual infantil e assédio sexual.

A indústria da pornografia não é criativa ou original em sua exploração de dinâmicas históricas e de poder social para criar um produto rentável. É preciso desigualdades existentes para torná-las sexy e divertidas. Os discursos e imagens têm como alvo grupos específicos de mulheres, dependendo do status e ocupação, raça, cor e etnia, e/ou sobre tamanho e forma, idade, deficiência, para tipos específicos de violência sexual e tortura, que remontam às desigualdades estruturais que operam na sociedade. Dessa forma, a pornografia promove a subordinação feminina, seja através da forma como é produzida, pela imagem vendida ou pela realidade social que ela constrói e corrobora, promovendo e naturalizando a violência de gênero.

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